Armas nucleares, cidades e o Brasil

Artigo publicado na Folha de S. Paulo, 17/10/2011
Por João Coser, Pol Helena Dhuyvetter e Takashi Morita


Foto: Huffington Post, com cortesia
da Life.com

Mais que simples objetos de status, armas nucleares têm objetivo de destruição que indiscrimina inocentes e que pode dizimar cidades inteiras

Armas nucleares podem parecer irrelevantes ao Brasil contemporâneo, mas não por acaso a presidente Dilma Rousseff levantou o tema novamente perante a ONU, em 22 de setembro último. Em suas palavras, "temos, sim, de avançar na reforma do Conselho de Segurança das Nações Unidas. Ele tem sido o baluarte da lógica do privilégio nuclear".

De fato, as estimadas 20 mil bombas restantes perpetuam um modelo de poder que o Brasil, como único país do Bric a não possuí-las, incansavelmente busca modificar. Mais do que simples objetos de status, armas nucleares têm um objetivo de destruição que indiscrimina inocentes. Além disso, podem aniquilar toda uma cidade, pondo fim a tudo o que gerações de prefeitos e cidadãos construíram. 

Nas palavras do secretário-geral da ONU, "enquanto essas armas existirem, ninguém está seguro". Cientistas alertam que a incineração de apenas 20 delas teria um impacto catastrófico no clima, levando à fome em escala global. Armas nucleares e mudança climática vêm sendo reconhecidas como os dois maiores desafios à segurança da sobrevivência humana. Tendo presenciado a devastação de suas cidades, os prefeitos de Hiroshima e Nagasaki criaram em 1982 uma rede internacional, levando a voz ativa dos governos locais em temas de paz e desarmamento, a Prefeitos pela Paz.

A rede opera sob uma lógica simples: em temas que afetam diretamente a sobrevivência das cidades, nada mais justo que essas recebam o direito de serem ouvidas e influenciarem decisões internacionais. O tema, que nasceu nas cidades de Hiroshima e Nagasaki, é hoje compartilhado internacionalmente por mais de 5.000 cidades, incluindo 66 no Brasil. 

Com crescente interação com governos federais, para promover o início das negociações de desarmamento nuclear, a organização recebe o apoio integral de Ban Ki-moon e do representante da ONU para desarmamento, Sergio Duarte. 

Numa época em que a crise financeira assola o mundo, é de se questionar os US$ 104,9 bilhões anualmente gastos em armas nucleares, em detrimento de esforços para prover necessidades humanas básicas. 

Como entes governamentais mais próximos da população, os prefeitos têm ciência de que a paz é condição necessária para o desenvolvimento, e de que é preciso lutar para garantir a sobrevivência de nossas cidades. Acreditamos que o Brasil e a presidente Dilma possam e devam fazer a diferença para avançar o desarmamento nuclear, liderando a campanha internacional proposta por Prefeitos pela Paz para a realização de uma conferência especial de desarmamento. 

Com o apoio de prefeitos e parlamentares de países que ainda apoiam a manutenção dos arsenais nucleares, é possível virar o debate, superando a paralisação que vem regendo a ONU nas últimas décadas. O Brasil, como potência mundial emergente, e nós, como cidadãos e seres humanos, só temos a ganhar com isso. Acreditando na importância de seu envolvimento em temas globais, a Frente Nacional de Prefeitos oficialmente se tornará parte da liderança de Prefeitos pela Paz durante encontro que se inicia hoje em Foz de Iguaçu.

Dessa forma, endossamos as palavras da presidente para que "redobremos nossos esforços em prol do desarmamento geral e completo das armas nucleares sob controle internacional estrito e efetivo", lembrando a comunidade global que cidades não podem ser alvos.

João Coser é prefeito de Vitória e presidente de Frente Nacional de Prefeitos.
Pol Heanna Dhuyvetter é assessor-executivo do prefeito de Hiroshima e diretor internacional de desenvolvimento de Prefeitos pela Paz.
Takashi Morita é presidente da Associação de Sobreviventes da Bomba Atômica no Brasil.

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