101º Fórum do Comitê de Cultura de Paz reúne estudiosos das relações étnico-raciais para falarem sobre o cuidado da história única

Já estão disponíveis para download a íntegra do áudio e as apresentações realizadas no 101º fórum do Comitê da Cultura de Paz. Basta clicar aqui. Abaixo, a notícia dada pelo portal Senac Setor 3.

Por Susana Sarmiento
Nanci Oliveira, José Adão de Oliveira, Lourdes Alves de 
Souza, Oswaldo Faustino e Wagner Celestino [da esq.
para a dir.].

Na terça-feira da semana passada [13/11], em um dos auditórios do Museu de Arte de São Paulo, diferentes especialistas discutirem o tema do encontro: Diálogos em torno do “perigo da história única”. Tratava-se do 101º Fórum do Comite da Cultura de Paz, em adesão ao Dia Nacional da Consciência Negra e à Década sInternacionaol dos Povos Afrodescendentes (2013-2022). Participaram: José Adão de Oliveira, para falar sobre o histórico e a importância do Dia Nacional da Consciência Negra (20/11); Nanci Oliveira, sobre o cenário atual da educação e discussão sobre as cotas; Oswaldo Faustino focou sua apresentação sobre como a mídia fala dos afrodescendentes; Wagner Celestino mostrou seu trabalho documental na fotografia com ícones da cultura paulistana, especificamente a velha guarda do samba paulistano; e Lourdes Alves de Souza, psicóloga e especialista em desenvolvimento local, mediou toda essa conversa.

Antes de ouvir os palestrantes, a mediadora apresentou aos participantes o vídeo da nigeriana Chimamanda Adichie, que fala do comum da história única e o perigo das pessoas entenderem uma situação apenas por um viés, não considerando um cenário, e até outras vozes. A romancista explica em um vídeo de 16 minutos, disponível no site do TEDx, de como ela descobriu sua voz cultural e adverte como ouvimos somente uma história sobre outra pessoa ou país, é comum cairmos em um desentendimento crítico, já que as vidas, as culturas são formadas por muitas histórias sobrepostas.

Seguindo a ideia exposta do vídeo, a mediadora propôs inicialmente os participantes conversarem com a pessoa ao lado para ouvir que situação, ou uma experiência de história única cada um já havia passado. “Para ouvir, é necessário ouvir a voz interior. É um exercício de abertura com o outro. Por mais estranho que seja, é um trabalho de respeito esse ouvir o outro. Para isso, é preciso ouvir atentamente o que significa, ficar no presente”, ressalta Lourdes.

Um mini TEDx
A primeira a falar foi a Nanci. A professora trabalhou durante três décadas no ensino público e é uma das fundadoras do Movimento Negro Unificado. Ela já contextualizou como foi a criação desse movimento nos anos 1970. “Se a gente for pensar na década de 1976, teve uma grande repercussão a morte de Herzog (jornalista Vladimir Herzog, morto no dia 25 de outubro de 1975) e a pressão dos órgãos de repressão. Nessa época, tiveram os primeiros atores públicos a favor da democratização”. Ela lembrou ainda que em 1977 foi um ano marcado pelos movimentos do primeiro de maio, as panfletagens na região do ABC, os movimentos estudantis, e lutas democráticas. Ela pontuou que essas lutas ajudaram a democratizar o maior acesso e o número de vagas na escola e na terra. “Não houve aumento de qualidade, nem de material. Sempre nas discussões de educação falam que é preciso ter responsabilidade das famílias. Estamos falando de uma população pobre e negra. A discussão deveria ser no investimento da educação pública. Há um desvio no foco dos debates e outras pontos chamam mais atenção, como ENEM (Exame Nacional do Ensino Médio), PROUNI (Programa Universidade Para Todos), entre outros”.

Já Adão, cofundador do Movimento Negro Unificado (representando o Núcleo Negro Socialista) em 1978, membro da coordenação Municipal do Movimento Negro Unificado e representante do segmento movimento negro na Comissão Executiva do Plano Municipal de Educação da Cidade de São Paulo, falou por meio de letras de músicas a história do afrodescendentes. Ele contou ainda sobre seu sogro que morreu aos 104 anos e tinha vergonha de andar sem camisa, para seus filhos não verem as marcas do xicote nas costas da época em que era escravizado. Para ele, a saída é amorização democrática educacional multiétnica sustentável.

Já o jornalista, escritor e estudioso sobre as relações étnico-raciais, Oswaldo Faustino focou sua apresentação sobre Quem somos nós dos olhos da mídia? Ele mostrou como os afrodescendentes eram apresentados nos jornais, inclusive as dificuldades na aplicação das leis nº 10.639/03 e nº 11.645/08. Ele citou a professora Dr. Petronilla Beatriz Gonçalves, professora titular de ensino-aprendizagem e de relações étnico-raciais na Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) e coordenadora do Grupo Gestor do Programa de Ações Afirmativas da UFSCar, sobre a aplicação da lei, sobre o modelo de sociedade, o que foi pensado e o que é reproduzindo pela educação brasileira.

O autor do livro Luana: As Sementes do Zumbi, editora pela FTD, de 2007, mostrou uma série de imagens de como apareciam os negros nos jornais. De 1808 até 1888, eles apareciam dentro dos anúncios de compra, venda e aluguel de escravos. Depois passaram a ocupar as páginas de noticiários policiais. Até os dias de hoje nas páginas dos cadernos de esporte, na parte de cultura, arte e literatura. Também pontuou que antigamente escritores como Machado de Assis e Lima Barreto eram esbranquecidos nas fotos.

Ele comentou ainda sobre o seu livro A Legião Negra – A luta dos afro-brasileiros na Revolução Constitucionalista de 1932, editado pela Selo Negro Edições. A publicação fala sobre a participação voluntária de um grande número de afrobrasileiros nesse movimento. Veja mais no link: http://bit.ly/UTy9fe

Para encerrar sua apresentação, Oswaldo convidou os participantes para observar a minissérie Subúrbia, lançado recentemente na TV Globo. “Vamos reparar no elenco em que é formado por quase 80% de4 afrodescendentes e quais servirão de modelos aos espectadores”.

Por meio de imagens, o fotógrafo Wagner mostrou sua pesquisa com os principais músicos e personagens da velha guarda do samba paulistano. Dona Philomena foi uma das primeiras pessoas a recebê-lo em sua própria casa e contou o início das escolas de samba na capital paulista. Nenê da Vila Matilde, Zelão da Rosas, Cabecinha, Feijoada foram alguns dos registrados por suas lentes. Esse último era instrumentista e tinha um projeto de formar uma orquestra apenas de cuícas.

O evento foi encerrado com uma homenagem para Eduardo de Oliveira, autor do Hino da Negritude e um dos primeiros militantes negros a favor da igualdade racial. Ele faleceu em julho deste ano.

A mediadora também reforçou que a próxima década da ONU é Década Internacional dos Povos Afrodescendentes.

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